Os caminhos de Ferro
- Afonso Cunha Viola
- 6 de dez. de 2022
- 2 min de leitura
Hoje venho falar-lhes de comboios. Escrevo sobre este assunto motivado pela
triste constatação de que é, hoje, impossível chegar-se a Santa Apolónia e tomar-se um
comboio par Paris. Aliás, para Paris ou para qualquer outra cidade europeia. Até há pouco
tempo mantinha-se a ligação com Madrid, agora nem isso. Como se pode justificar, à luz
da razão, o sucessivo e continuado desinvestimento na ferrovia? Como?
O comboio é, sem dúvida, o meu meio de transporte predilecto. É seguro,
ecológico, pode ser rápido, pode ainda ser económico, mas acima de tudo é confortável.
Ao contrário do avião ou do automóvel não nos prende no assento, permite-nos circular,
permite-nos estar de pé, permite-nos uma envolvência singular com a paisagem. Assim
sendo, por que razão não se encontram já todas as capitais europeias ligadas pelo
comboio? Bom, a verdade é que o caminho existe. E tanto existe que serviu durante
décadas os que com malas de cartão e alguma esperança deixaram Lisboa em busca de
melhores vidas. Ora, se existem os meios, o que falta? Pois bem, falta o interesse.
Esta falta de interesse tem sido pública, mas também particular. Pública, na
medida em que cabe aos governos criar e alimentar as estruturas necessárias a uma rede
e a um serviço de qualidade. Particular, na medida em que as empresas não têm procurado
a ferrovia enquanto rede de comunicação e circulação de capitais. Não quero dizer que
esta realidade é transversal a todos os países europeus, porque não é. Mas acho criticável
a inexistência de um plano director comum, estabelecedor de directrizes e capaz de
constituir uma rede ferroviária integrada.
Se um dos principais benefícios da União Europeia é a mobilidade, então que o
comboio seja preponderante nesse campo. Um investimento nos caminhos de ferro
europeus representaria um consequente alívio do tráfego aéreo, o que não só seria
benéfico ambientalmente, como também logisticamente. Permita-se a aproximação dos
povos através do comboio, à semelhança do que aconteceu nos séculos XIX e XX, mas,
agora, com mais eficiência.
Em suma, o comboio é um meio de transporte ideal para longas distâncias, dados
o seu conforto e os horizontes da sua eficiência. É, também, o meio através do qual a
mobilidade europeia pode melhorar e tornar-se mais ecológica. Para isto, é preciso que a
União Europeia defina metas e que apoie os estados-membros nos desenvolvimentos das
suas ferrovias e é preciso que a sociedade civil tome consciência das vantagens deste
meio, passando a preferi-lo em detrimento dos demais. Vejo o comboio como o transporte
da Europa. Faço, portanto, votos de que em breve se possa comprar em Santa Apolónia
um bilhete de comboio para a Gare d'Austerlitz.
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