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Os Quarenta e Quatro e a Paz Perpétua

Na passada quinta-feira, em Praga, reuniram pela primeira vez, em consílio, os

quarenta e quatro líderes da recém-criada Comunidade Política Europeia (CPE). Esta

nova organização, fruto da presidência francesa da União Europeia e, em particular, do

empenho de Emmanuel Macron, terá como principal objectivo a construção de diálogos

indutores da cooperação entre os estados europeus, num quadro alargado para lá das

fronteiras da União Europeia. Espera-se, portanto, que da reunião regular destes líderes

surjam os consensos necessários a um avanço comum rumo à prosperidade e à paz.


Em primeiro lugar, é de notar que existe desde 1949 o Conselho da Europa, que

foi criado com os mesmos, ou pelo menos muito semelhantes, propósitos da CPE. Por

isso é legitimo questionarmo-nos sobre a diferença entre os dois conselhos. É certo que à

primeira vista, não há grande diferença. Contudo, uma análise mais cuidada faz denotar

que o que mais distingue as duas organizações é o contexto em que a última se está a

formar. O Conselho da Europa, sendo a mais antiga instituição europeia em funcionamento, vem sofrendo o desgaste do tempo. Para mais, não se pode dissociar a fundação da CPE da guerra na Ucrânia e da presidência francesa da União Europeia. Pois se por um lado é simbólica a exclusão da Rússia desta nova organização, também é destacável o empenho francês na sua fundação, indicador das aspirações de Paris e, em particular de Macron, em torno da liderança da Europa.


É certo que o Conselho da Europa suspendeu a Rússia, criando a oportunidade

para retirada permanente da mesma, que veio a acontecer em Março passado. Por isso, a

ausência da Rússia é, actualmente, comum às duas organizações. No entanto, é de

considerar que a CPE surge com o claro intento de unir os países europeus num bloco

capaz de fazer face aos desafios do presente. A CPE parece-me ser a chave de um modelo

de reorganização geopolítica, que dará à Europa a possibilidade de prosperar em paz, com

relativa independência dos blocos Americano e Asiático, pelo menos, se a política de

Emmanuel Macron prevalecer.


E a política de Macron é concretamente a expansão da União Europeia ou, no mínimo, a expansão da área influenciada pela União. E esta ideia não é nova, aliás, trata-se do avanço do projecto europeu. Contudo, antevêem-se grandes dificuldades à concretização de tal projecto, pois se já são difíceis o consenso e a coesão entre os vinte e sete, quanto mais difícil será achá-los entre os quarenta e quatro? Eu defendo que os valores europeus se devem alargar a todas as comunidades que deles queiram comungar, porém se dentro da União se começa a mostrar difícil essa partilha de valores, torna-se também complicado acreditar na sua proliferação para lá da União. E, sendo assim, acrescento mais uma questão: Será mesmo possível alcançar, no presente, os consensos que a CPE pretende? Espero que seja.


Em suma, a criação da CPE não desempenha uma completa novidade na tentativa de fazer da Europa a confederação de estados capaz de assegurar a prosperidade e a paz perpétua, o Conselho da Europa teve e tem esse intento (se bem que considere que as duas organizações não tenham sentido em simultâneo e que, portanto, o Conselho da Europa, sendo mais velho, acabará por legar as suas funções a esta nova organização).

Mas é inegável que a CPE surge num momento oportuno, possibilitador de uma reorganização geopolítica. Há, agora, que dar tempo ao tempo e ver se esta nova

comunidade tem estofo para ultrapassar as diferenças entre os seus membros e as

perigosas ambições de alguns estados (e de alguns líderes).

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