Os Negligenciados Europeus
- João Miguel Miranda
- 26 de out. de 2022
- 2 min de leitura
Finalmente, depois de muita espera, a União Europeia vai avançar com sanções contra o regime iraniano, mas não pelas razões que poderão considerar óbvias, não. A UE não avançou com sanções devido à morte de várias centenas de mulheres e manifestantes, na sua luta pela liberdade. A UE decidiu avançar com sanções por causa do envio de drones kamikaze iranianos para os campos de batalha na Ucrânia, porque isso, sim, é que importa.
Não me deixem generalizar. De facto, a UE avançou com sanções contra onze pessoas e quatro entidades iranianas devido à morte de Mahsa Amini:
“As designações hoje anunciadas incluem os responsáveis pela morte de Mahsa Amini: a polícia da moralidade do Irão e duas das suas principais figuras, Mohammad Rostami e Hajahmad Mirzaei. Além disso, a UE designou as forças policiais iranianas, bem como alguns dos seus chefes a nível local, pelo seu papel na repressão brutal dos protestos. A UE designou igualmente Issa Zarepour, ministro iraniano das Tecnologias da Informação e Comunicação, pela sua responsabilidade no bloqueio total da Internet.”1
O que podemos notar, primeiro de tudo, é que as sanções falham completamente a alvejar as cabeças do regime assassino de Ebrahim Raisi e Mohammad Bagher Ghalibaf e, depois, falham na sua determinação e dureza como se assistiu (e que se continua a assistir) na caça às bruxas dos oligarcas, filhas, amigos e amigas, familiares, vizinhos de cantina, vizinhos de rua, prédio e cama de Putin.
A mim, o que me parece, é que a União Europeia considera muito mais repudiante matar os habitantes de outro país vizinho, do que matar os seus próprios habitantes que lutam por liberdade, quando, na verdade, são o mesmo. Mas, isso, não pode ser nada de novo, quando relatos sobre liberdade de expressão e castigos violentos e até mortíferos já nos chegavam há anos da Rússia e nunca se fez nada. É o Don’t ask, don’t tell das amizades do petróleo…"Finjamos que está tudo bem, desde que continuem a mandar vir o petróleo e o gás a bom preço. Combinado?”.
Numa altura em que as mulheres do Irão continuam a lutar e a morrer, (os protestos seguem fortes para a sua sexta semana) a União Europeia esconde-se atrás das sua grande bandeira: a Ucrânia e os ucranianos. O resto…Não interessa muito. Não interessa os milhares que já foram assassinados no Irão, não nos interessa muito, também, o crescimento da extrema-direita na Europa ou o aumento de crimes de ódio dirigidos à comunidade LGBT+, como aconteceu na Eslováquia recentemente, e muito menos, não nos interessa as 5000 pessoas que já morreram desde o inicio de 2022 ao tentar entrar na Europa.
Em 2070, é esperado que a população mundial seja constituída, maioritariamente, pela população do continente africano. Se queremos que a UE seja um projeto duradouro, se queremos que a UE tenha um papel de influência no cenário de 2070, se queremos que a UE pare de ter sangue a escorrer pelas suas mãos, temos, obrigatoriamente, de começar a olhar para fora das nossas fronteiras. E isso não significa que devamos parar ou abrandar o nosso trabalho de auto-análise e construção progressiva interna, que temos vindo a desenvolver desde o momento que o projeto foi criado, mas também não impede que o nosso olhar não se foque no futuro.
1 https://www.consilium.europa.eu/pt/press/press-releases/2022/10/17/iran-eu-sanctions-perpetrators-of-serious-human-rights-violations/
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