Portugal, Polónia, Hungria e Irlanda: Manifestações Pró-Vida na União Europeia
- Lourenço Pinto Ribeiro
- 25 de out. de 2022
- 5 min de leitura
Devido às condições meteorológicas que se têm verificado em Portugal continental, foi adiada uma das manifestações públicas que, anualmente e desde 2012, tem sido referência na tomada de posição do povo português relativamente à dignidade da vida (“desde o momento da conceção até à morte natural”)1. A Caminhada Pela Vida, que atualmente ocorre em cinco cidades portuguesas (Lisboa, Porto, Aveiro, Braga e Viseu), deu origem à Iniciativa Europeia “One of Us”, à Iniciativa Legislativa de Cidadão “Pelo Direito a Nascer” e à petição “Toda a Vida tem Dignidade”2 e não faltarão oportunidades e condições para despertar mais iniciativas, movimentos e chamadas de atenção à necessidade de discutir o “direito da mulher a decidir sobre o seu corpo”, como se o corpo de uma mulher grávida fosse só dela própria.
Em Varsóvia, ainda no dia dezoito de Setembro deste ano, mais de dez mil pessoal participaram na Marcha Pela Vida e Pela Família. Em todas as cento e cinquenta localidades na Polónica em que esta marcha é organizada, nunca aparecem menos que alguns milhares de pessoas3. Numa alusão aos votos de casamento, a marcha ocorreu sob o lema “Eu Prometo-te”, o que vincula os manifestantes a um compromisso com vários seres humanos, nos mais diversos contextos. Pawel Ozdoba, presidente do Centro pela Vida e pela Família, consegue apresentar uma ideia sobre a presença desta referência: “Este ano queremos lembrar aos cônjuges e àqueles destinados ao casamento acerca do significado e da importância dos votos de casamento.”4 Não é por acaso que a renovação dos votos de casamento ocorreu precisamente antes da marcha. No meio de milhares de pessoas, de balões de várias cores e de bandeiras brancas e vermelhas, também foi possível observar outras insígnias tais como “A vida é bela”, “Que as crianças vivam”, “Eu escolho a vida” e “A paternidade começa com a conceção. Responsabilidades iguais, direitos iguais”. A participação nesta marcha contou ainda com as felicitações do presidente polaco, Andrzej Duda: Estou muito contente que vocês estejam outra vez a marchar pelas ruas de Varsóvia. Avôs, pais, crianças e futuros pais formam, no dia de hoje, uma grande e alegre comunidade. Juntos estão a dar um testemunho público do vosso compromisso com os ideais mais nobres. Vocês expressam a convicção de que uma família forte significa um futuro bem-sucedido para o nosso país.”5 Muitos poderão pensar que as pessoas presentes na marcha não precisavam das palavras do chefe de estado polaco para se mobilizarem contra atentados de relativização do direito à vida dos nascituros, já para não falarmos dos atentados contra a conservação e a promoção de determinados modelos familiares, que se têm verificado em muitas sociedades ocidentais através da “aproximação” entre os direitos sociais das uniões de facto aos direitos sociais do casamento.
A Hungria também tem sido algo (ou muito) provocadora no que concerne ao desenvolvimento de políticas natalistas e de planeamento familiar. Apesar de o primeiro-ministro Vitor Órban e a presidente Katalina Novak ainda se terem de contentar com a aplicabilidade da lei que determina a possibilidade da realização do aberto até à décima segunda semana de gravidez, o Ministro do Interior, Sándor Pinté, assinou um decreto com vista a emendar esta lei reguladora da proteção da vida no feto. Desde o dia treze de Setembro deste ano que as mulheres grávidas são obrigadas a ouvir o batimento cardíaco do feto antes de avançarem com um aborto.6 Mais concretamente, a emenda exige que a requisição de um aborto não seja realizada antes da apresentação (por parte da mulher) de um documento emitido por um obstetra ou um ginecologista que certifique de que as mulheres grávidas (que intencionem fazer um aborto) tiveram conhecimento de uma clara “identificação dos sinais vitais do feto”7. Líder de um governo orgulhoso dos seus feitos e tentativas na defesa dos valores familiares, já em 2019 Órban anunciara que as mulheres que tivessem quatro filhos ficariam isentas do pagamento de impostos sobre o rendimento8.
Outro sinal de demanda pela representação das perspetivas pró-vida na Europa foi a Marcha Pela Vida, que ocorreu em Dublin no dia dezassete de Setembro deste ano9. Não abdicando de uma inevitável demonstração de apoio de tomada de medidas de auxílio às mulheres sujeitas a uma gravidez não planeada, a marcha foi uma chamada de atenção à forma como a “Revisão de Três Anos” da lei irlandesa sobre o aborto se poderá desenrolar. Aprovada em 2018 e aplicável desde 2019, a lei do aborto irlandesa retira direitos aos nascituros até às primeiras doze semanas de gravidez. Carol Nonal, parlamentar irlandesa e ex-militante do partido Sinn Féin, não admite de existam razões para que “o Governo esteja a excluir o movimento pró-vida do processo de revisão trianual”, achando inaceitável que “o Ministro da Saúde se encontrar repetidamente com grupos pró-aborto pelas suas visões daquilo que se deve fazer perante a revisão, enquanto se recusa a reunir com representantes pró-vida”10. A marcha coloca em evidência as experiências de pessoas que já abortaram e que admitem terem tido segundos pensamentos sobre a prática do aborto, como é o caso de Rachel Mackenzie: “Eu sei o que é um arrependimento posterior a um aborto, como o sabem inúmeros outros. É a altura de os políticos saberem que pessoas como eu existem.” Mackenzie continua provocando saudades de uma época em que havia um consenso sobre a necessidade de haver barreiras legais significativas ao aborto: “As mulheres e os bebés nascituros merecem mais do que um sistema que oferece apenas o aborto. Podemos fazer melhor que isto. As mulheres que se deparam com uma gravidez não planeada precisam de receber boas alternativas porque vê-se que uma escolha não é escolha.” 11
No mesmo país, ainda no início deste ano, o All Ireland Rally For Life reuniu vários manifestantes que insistiram na continuação da previsão na lei do período de espera de três dias entre o pedido do aborto e a realização do aborto12. Segundo dados apresentados pela anteriormente mencionada deputada Carol Nolan, e citando a porta-voz do rally Megan Ní Scealláin, “entre 800 e 1000 mulheres não avançaram com o aborto após a consulta inicial. Demolir essa exigência de três dias destinados à reflexão pode significar um acréscimo de 1000 abortos por ano.”13
No caso húngaro, o direito que as mulheres adquiriram) através do decreto emitido pelo Ministro do Interior) de escutarem o batimento cardíaco dos seus bebés é chamado pelos abortistas de “imposição”, como se houvesse uma qualquer obrigatoriedade moral de impedir as mulheres grávidas de desconhecerem a realidade sobre as vidas de terceiros nos seus ventres. Como se a imprensa não bastasse, um dia a seguir à emissão do decreto, o Parlamento Europeu subscreveu um relatório segundo o qual a Hungria tinha deixado de ser uma democracia plena e que os direitos dos cidadãos húngaros se encontram ameaçados14. As instituições europeias não parecem dar um bom exemplo de funcionamento se selecionam assuntos internos de Estados-membros da União Europeia como a “regra do batimento cardíaco” como argumentos para se pronunciarem sobre a qualidade ou o estado da democracia nesses países. No caso irlandês, diria o mesmo a todos aqueles que insistem que a lei não deve prever um período de reflexão entre a primeira consulta de averiguação da pertinência do aborto e a sua concretização. É só com a reflexão e com a apresentação de todas as alternativas e implicações de um aborto que as mulheres serão livres.
Não ignorando o potencial da União Europeia para ser um espaço de liberdade, paz e prosperidade, não podemos admitir que realize cordões sanitários a políticas públicas que não ignorem que, em qualquer gravidez, há uma vida em gestação que também está em jogo e que merece ser ponderada. Pelo que temos visto, muitos portugueses, polacos, húngaros e irlandeses parecem partilhar esta visão. Esperemos que não triunfe uma ideia segundo a qual o progresso depende da progressiva exclusão desta tomada de posição no espaço europeu.
3 https://www.catholicnewsagency.com/news/252328/polands-march-for-life-and-family-draws-10000-people
4 Idem
7 https://mandiner.hu/cikk/20220913_belfold_szivhang_magzatvedelem_pinter_sandor_magzati_elet_vedelme
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